Depois de amargar as primeiras rodadas na zona de rebaixamento, o Avaí conseguiu uma incrível ascensão no Brasileirão. Já são oito jogos de invencibilidade (seis vitórias e dois empates), que o levaram para o sétimo lugar no campeonato. E o sucesso pode ser explicado pela devoção dos jogadores, que se reúnem quase todas as noites de segunda-feira com um consultor espiritual.
As reuniões acontecem próximas ao Estádio da Ressacada, em Florianópolis, e são ministradas pelo consultor Johnny Monteiro, amigo pessoal do técnico Silas - os dois se conhecem desde a década de 1980, quando Silas ainda era jogador do São Paulo.
“O Avaí é um clube profissional”, explica Johnny. “O ambiente é muito bom e os jogadores demonstram vontade. O Silas formou uma verdadeira família, e isso gerou uma junção que você não vê muitas vezes num clube. Aqui todos se respeitam e não saem nas noitadas.”
Johnny diz que trabalha o lado emocional e tenta dar ânimo aos atletas com a transmissão da palavra de Deus. “Cerca de 99% dos jogadores participam. Sempre que posso acompanho o grupo nos jogos. Nossas reuniões contam com orações, músicas e adoração. É uma linguagem que os jogadores entendem”, conta o consultor.
Sobre a ascensão do Avaí, Johnny revela que os jogadores jamais perderam a esperança. “A recuperação foi na base da superação, da mentalização. O Silas contribuiu muito com isso também, porque ele é alguém que tem uma relação especial com Deus”, diz.
[Fonte: Estadão]
Vou usar esta reportagem como base para um questionamento que há tempos repercute no meio esportivo e que cria uma certa polêmica: o uso de elementos e/ou expressões religiosas por parte dos esportistas. A mania que os jogadores evangélicos têm de comemorar os seus gols, defesas e perfomances em campos, quadros e afins, incomoda a alguns dirigentes e entendidos de esportes. A ênfase, obviamente, recai sobre o futebol. Quem não se lembra da polêmica criada pelo jogador [e presbítero da Renascer] Kaká e sua famosa camiseta com os dizeres "I belong to JESUS!"? E o gesto dos indicadores voltados para o alto, usado por todos os jogadores crentes?
As constantes manifestações religiosas dos jogadores brasileiros nos campos de futebol começam a despertar reações. De acordo com a revista CartaCapital, de 8 de julho, a Associação Dinamarquesa de Futebol considerou um “exagero” a fervorosa oração feita dentro de campo por jogadores e integrantes da comissão técnica da seleção brasileira após a conquista da Copa das Confederações, na África do Sul, no fim de junho. Os dinamarqueses sugeriram, inclusive, que a Fifa, entidade máxima do futebol, punisse os brasileiros.
Vejam, por exemplo, o que escreveu Juca Kfouri em sua coluna no caderno "Esporte" da Folha de São Paulo:
JUCA KFOURI
Deixem Jesus em paz
Está ficando a cada dia mais insuportável o proselitismo religioso que invadiu o futebol brasileiro
MEU PAI, na primeira vez em que me ouviu dizer que eu era ateu, me disse para mudar o discurso e dizer que eu era agnóstico: "Você não tem cultura para se dizer ateu", sentenciou.
Confesso que fiquei meio sem entender. Até que, nem faz muito tempo, pude ler "Em que Creem os que Não Creem", uma troca de cartas entre Umberto Eco e o cardeal Martini, de Milão, livro editado no Brasil pela editora Record.
De fato, o velho tinha razão, motivo pelo qual, ele mesmo, incomparavelmente mais culto, se dissesse agnóstico, embora fosse ateu.
Pois o embate entre Eco e Martini, principalmente pelos argumentos do brilhante cardeal milanês, não é coisa para qualquer um, tamanha a profundidade filosófica e teológica do religioso. Dele entendi, se tanto, uns 10%. E olhe lá.
Eco, não menos brilhante, é mais fácil de entender em seu ateísmo.
Até então, me bastava com o pensador marxista, também italiano, Antonio Gramsci, que evoluiu da clássica visão que tratava a religião como ópio do povo para vê-la inclusive com características revolucionárias, razão pela qual pregava a tolerância, a compreensão, principalmente com o catolicismo.
E negar o papel de resistência e de vanguarda de setores religiosos durante a ditadura brasileira equivaleria a um crime de falso testemunho, o que me levou, à época, a andar próximo da Igreja, sem deixar de fazer pequenas provocações, com todo respeito. Respeito que preservo, apesar de, e com o perdão por tamanha digressão, me pareça pecado usar o nome em vão de quem nada tem a ver com futebol, coisa que, se bem me lembro de minhas aulas de catecismo, está no segundo mandamento das leis de Deus.
E como o santo nome anda sendo usado em vão por jogadores da seleção brasileira, de Kaká ao capitão Lúcio, passando por pretendentes a ela, como o goleiro Fábio, do Cruzeiro, e chegando aos apenas chatos, como Roberto Brum.
Ninguém, rigorosamente ninguém, mesmo que seja evangélico, protestante, católico, muçulmano, judeu, budista ou o que for, deveria fazer merchan religioso em jogos de futebol nem usar camisetas de propaganda demagógicas e até em inglês, além de repetir ameaças sobre o fogo eterno e baboseiras semelhantes, como as da enlouquecida pastora casada com Kaká, uma mocinha fanática, fundamentalista ou esperta demais para tentar nos convencer que foi Deus quem pôs dinheiro no Real Madrid para contratar seu jovem marido em plena crise mundial. Ora, há limites para tudo.
É um tal de jogador comemorar gol olhando e apontando para o céu como se tivesse alguém lá em cima responsável pela façanha, um despropósito, por exemplo, com os goleiros evangélicos, que deveriam olhar também para o alto e fazer um gesto obsceno a cada gol que levassem de seus irmãos... Ora bolas!
Que cada um faça o que bem entender de suas crenças nos locais apropriados para tal, mas não queiram impingi-las nossas goelas abaixo, porque fazê-lo é uma invasão inadmissível e irritante.
Não mesmo é à toa que Deus prefere os ateus...
Tudo bem que Juca Kfouri não é ninguém em quem se possa dar um mínimo sequer de crédito, mas concordo em termos com ele. Mas, qual sua opinião sobre esse assunto?